Luis Fernando Verissimo, um dos maiores escritores do Brasil, morre aos 88 anos

Foto: Ricardo Jaeger

O escritor Luis Fernando Verissimo morreu aos 88 anos, na madrugada deste sábado (30), em Porto Alegre (RS). Ele estava internado desde 11 de agosto na UTI do Hospital Moinhos de Vento e, conforme a instituição, não resistiu a complicações de uma pneumonia.

O autor enfrentava problemas de saúde há alguns anos. Diagnosticado com Parkinson e doenças cardíacas, implantou um marcapasso em 2016. Em 2021, sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC) e, de acordo com a família, passou a ter dificuldades de locomoção e de fala.

Verissimo deixa a esposa, Lúcia Helena Massa, além de três filhos e dois netos.

A cerimônia de despedida ocorrerá a partir do meio-dia no Salão Nobre Julio de Castilhos, na Assembleia Legislativa gaúcha.

Verissimo afirmava ter herdado a leveza e a informalidade do pai, Erico

Verissimo afirmava ter herdado a leveza e a informalidade do pai, Erico. Nascido em Porto Alegre em 26 de setembro de 1936, passou parte da infância nos Estados Unidos, período em que o pai — o renomado escritor Erico Verissimo, autor de clássicos como O Tempo e o Vento — lecionava literatura brasileira nas universidades de Berkeley e Oakland.

“O pai foi um dos primeiros escritores brasileiros a escrever de uma maneira mais informal. E eu acho que herdei um pouco isso. Essa informalidade na maneira de escrever”, ressaltou em relação ao pai.

Luis Fernando Verissimo vendeu 5,6 milhões de exemplares

A trajetória profissional de Verissimo começou no jornal Zero Hora, de Porto Alegre, onde atuou como revisor a partir de 1966. Mais tarde, trabalhou como tradutor no Rio de Janeiro.

Seu primeiro livro, O Popular, foi lançado em 1973. Ao longo da carreira, publicou mais de 70 obras, entre crônicas, romances, contos e quadrinhos, totalizando 5,6 milhões de livros vendidos.

Além da literatura, Verissimo colaborava com colunas em jornais como O Estado de S.Paulo, O Globo e Zero Hora.

Discreto em relação à vida pessoal e aos comentários públicos, ele continuava morando na casa da infância após retornar ao Brasil. O imóvel, situado no Bairro Petrópolis, em Porto Alegre, foi adquirido pelo pai em 1941.

O escritório de Erico Verissimo permaneceu intacto, preservado pela família. Cercado de livros, Luis Fernando escrevia em outro cômodo da residência, onde também guardava seu saxofone e uma vasta coleção de discos e CDs de jazz.

Metódico em sua rotina, interrompia o trabalho apenas quando a esposa, Lúcia, chamava para o almoço. À noite, assistia ao Jornal Nacional, e quando queria aproveitar sua música favorita, fazia isso com total atenção. “Música é sentar e ouvir”, comentou em entrevista de 2012.

Ed Mort’, ‘O Analista de Bagé’ e outros personagens

O humor presente em suas crônicas e contos se tornou uma marca registrada de sua obra. Entre os personagens mais famosos estão os de Ed Mort e outras histórias (1979), O Analista de Bagé (1981) e A Velhinha de Taubaté (1983). Nos anos 70, também criou a tirinha As Cobras, publicada no jornal Folha da Manhã.

Em 1994, o livro Comédias da Vida Privada inspirou uma série da Rede Globo, que foi produzida ao longo de três anos.

“Um desafio porque o humor de televisão, ao contrário do que possa parecer, é mais difícil de fazer que o humor impresso, o humor gráfico, vamos dizer assim (…) Não tenho uma vocação humorística, mas consigo eventualmente produzir humor. Mas é uma coisa mais deliberada, mais pensada, do que espontânea, no meu caso”, disse em entrevista na época.

No final dos anos 1980, Verissimo atuou como um dos roteiristas do programa de humor TV Pirata. Entre seus livros de sucesso comercial estão Comédias para se ler na escola e As Mentiras que os Homens Contam (2000).

Um escritor e músico reservado

Durante o período em que viveu nos Estados Unidos, estudou na Roosevelt High School, em Washington, onde descobriu sua paixão pelo jazz e começou a ter aulas de saxofone. No entanto, por trás do instrumento e das páginas de seus livros, escondia-se um homem naturalmente reservado e tímido.

“Minha timidez é… Por exemplo: tenho horror de fazer isso que estou fazendo agora: dar entrevista, falar em público e tal. Eu sempre digo que não dominei a arte de falar e escrever ao mesmo tempo, são duas coisas que se excluem, então é nesse sentido é que se manifesta a minha timidez”, relatou à RBS TV

No entanto, a moderação nas palavras não se estendia às máquinas de escrever e, mais tarde, aos computadores. O escritor reservado tinha muito a expressar. “Essa é uma das vantagens da crônica. A gente pode ser o que quiser escrevendo uma crônica”.

A cada reconhecimento, como ao completar 80 anos, surgiam novas provas de que ele não precisava de longas palavras para arrancar um sorriso. “Têm sido tão agradáveis as homenagens, inclusive da família, que eu tô pensando em fazer 80 anos mais vezes”, comentou em tom de humor.

Em 2012, durante participação no programa GloboNews Literatura, ele comentou sobre seu habitual comportamento introspectivo. Famoso por respostas breves em entrevistas, Luis Fernando Verissimo afirmou que não se considerava uma pessoa silenciosa. “Não sou eu que falo pouco, os outros é que falam muito”.

Amor pelo futebol e pelo Inter

Além do jazz e da literatura, o futebol também era uma grande paixão de Luis Fernando Verissimo, especialmente o Internacional, clube ao qual demonstrou lealdade em várias ocasiões. O time também inspirou seu livro Internacional, Autobiografia de uma Paixão. Em entrevista de abril de 2012, ele recordou seu jogo mais marcante: um clássico Gre-Nal, que marcou sua primeira experiência em um estádio de futebol.

“Lembro a emoção de estar em campo. Só ouvia futebol pelo rádio. Ali, uma cerca nos separava dos jogadores. Dava para ver as feições, sentir a respiração deles. Eu estava vendo as cores do jogo, uma sensação completamente diferente. Nunca vou me esquecer também do cheiro de grama”, recordou-se do Estádio dos Eucaliptos, antigo estádio do Inter.

Cobriu Copas do Mundo desde 1986, edição em que lamentou a eliminação do Brasil nos pênaltis para a França, nas quartas de final — uma partida que, segundo ele, ficou marcada em sua memória. Pelo Internacional, recordou inúmeros momentos memoráveis, destacando com entusiasmo a final do Brasileirão de 1975 e o tricampeonato invicto de 1979.

Em relação ao título do Mundial de Clubes de 2006, conquistado pelo Inter, produziu a crônica “Não me acordem”, muito celebrada pelos torcedores colorados. “Vejo como o triunfo do Gabiru (autor do gol), o grande herói que era criticado. Algo meio melodramático. Foi um momento de sonho. Antes do jogo, o sentimento era: ‘Se perder de pouco, está bom’”, recordava.

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